sábado, dezembro 28

Crítica: De Olhos Bem Fechados (1999)


Por Maurício Owada

"A última obra de um gênio, mas uma das poucas coisas
que ele ainda tinha em mente"

Stanley Kubrick estabelece nos primeiros minutos, uma família plenamente estabelecida, um casal belo com uma filha doce e a árvore de Natal brilhando belamente com um amontoado de decorações. Eles vão a uma festa e ambos, separadamente, oscilam entre o compromisso do casamento e a aventura sexual após serem flertados. Claro que após aquilo, tudo corre muito bem até que os personagens, sob efeito de maconha, acabam discutindo e Alice (Nicole Kidman) confessa ao seu marido, o médico William Harford (Tom Cruise) que sentira atração por outro homem e que teria fugido e largado tudo, se tivesse tido a chance. Atônito, acaba seguindo noite à dentro no meio de Nova York e acaba indo parar em uma seita secreta que cultua o sexo.

De Olhos Bem Fechados (Eyes Wide Shut) é uma viagem quase onírica aos desejos e não trata apenas do tema sexo, o cineasta vai além e em seus personagens, recheados de frustrações e paixões inconfessas. Kubrick analisa não só o comportamento desses indivíduos, como a sociedade que os ronda. O músico que largou a faculdade de medicina, uma moça apaixonada por alguém casado ou uma prostituta são alguns dos personagens que serve de base para o olhar do Kubrick não só dos anseios do ser humano, como as relações funcionam entre eles, seja a orgia generalizada na seita ou uma relação fria.

Apesar do filme andar bastante devagar no começo, o filme de Kubrick só começa a se tornar mais interessante e misterioso em sua segunda metade, aonde eventos estranhos sucedem a noite de sexo completo e é aí que a mão do diretor fica mais presente, mesmo que não seja o seu filme que apresente com ênfase as características visuais que definem o seu estilo, apesar da belíssima e bizarra cena do ritual, com máscaras estranhas e desformes sob a trilha-sonora densa e enigmática de Jocelyn Pook. Como na maioria dos filmes, a música nos filmes do cineasta varia entre hits como Baby Did a Bad Bad Thing, de Chris Isaak até a música erudita de György Ligeti e seu Musica Ricercata No. 2, cuja versão tocada no filme foi gravado por Dominic Harlan, que ajuda a denotar o tom de suspense e ao mesmo tempo, de onirismo.

Mesmo com Tom Cruise como protagonista, já que o filme é regido pelo olhar dele em sua maior parte, é Nicole Kidman é quem domina a cena, ficando bem claro na confissão dos desejos de sua personagem, construindo uma esposa que segue o seu dever de esposa, controlando as chamas do puro desejo sexual que está prestes a explodir. Contando com a participação especial de Sydney Pollack e sua última cena é a prova de Kubrick, que é mais conhecido pela simetria e outros elementos em sua composição imagética que reproduziu em seus filmes e tornou o seu estilo único, também era um grande roteirista (que escrevera em conjunto com Frederic Raphael), construindo diálogos bem construídos que trás uma ambiguidade, que é ressaltada pela fotografia aonde predomina as cores quentes, como o laranja e principalmente o vermelho (bastante presente nos cenários de seus filmes), contrastando com uma cor fria como o azul que aparece pontualmente em momentos chaves.

Não é o melhor filme de Stanley Kubrick, mesmo com uma estética aguçada refletida na fotografia, na direção de arte e na mise-en-scéne, não possui o impacto de seus trabalhos anteriores, é menos transgressivo ou inovador, mas ainda, é um filme que consegue fechar com chave de ouro a carreira de um gênio.

Nota: 8,5/10,0




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